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Elise Dawson
12 septembre 2005

No topo da ciência.

 

Tive a honra de conhecer o ilustre expoente das ciências John Warcup Cornforth na série de conferências promovidas pelo Australian Institute, em meados dos anos 90, e o privilégio de agradecê-lo pessoalmente por suas décadas de trabalho pela humanidade. A partir disto, logrei o prazer de conviver com esta admirável figura humana por alguns anos, mesmo fora dos meios científicos e acadêmicos. Além de ter uma mente iluminada e ser um profissional mais que vencedor, é um homem de caráter, correto, probo, e de um coração de ouro, digno de todos os êxitos e glórias. As premiações que conquistou no transcorrer de sua carreira brilhante não representam nada perto do prêmio que ele é para a sociedade. Nós é que somos laureados!

Cornforth sempre foi um homem pensativo e, além de ter contribuído com os seus serviços para o avanço da química, sempre sublinhou a importância do papel dos cientistas na sociedade. Ele costuma afirmar que considerar virtuosa a fé, além da razão, tem sido prejudicial para os homens e, como sempre, a maioria dos danos é realizada pelas pessoas que estão convencidas de estarem certas. Diz ainda que a disciplina da ciência tem gerado uma relação especial com a verdade.

Ele nasceu em Sydney, em 7 de setembro de 1917. O segundo dos quatro filhos de seu pai, J.W. Cornforth, um inglês graduado da Oxford University, e sua mãe, Hilda Eipper Cornforth, oriunda de uma família alemã que havia imigrado para a Austrália no princípio do século XIX. Começou a praticar química já na adolescência, em um laboratório doméstico improvisado.

Passou parte de sua infância em Sydney e parte em Armidale, Nova Gales do Sul, e foi diagnosticado com otosclerose (tida como hereditária, é um dos casos mais comuns de surdez progressiva entre jovens; está relacionada ao crescimento anormal do estribo, um dos ossos no ouvido interno, o que impede que estruturas dentro do ouvido trabalhem de um modo correto; portanto, vai causando diminuição na audição) quando tinha quase 12 anos, tendo sofrido o aumento progressivo da perda auditiva desde a idade de 10. Mesmo assim, foi capaz de freqüentar aulas regulares na Sydney Boys' High School. Quando entrou na University of Sydney aos 16 anos, estava completamente surdo.

Cornforth demonstrou aos seus professores de faculdade um grande talento para o trabalho de laboratório em química orgânica, apesar de não conseguir ouvir nenhuma das aulas. Por força desta labuta prática laboratorial, e de sua atenção especial aos livros didáticos, concluiu sua graduação universitária em 1937. 

Depois, passou um ano fazendo pesquisas de pós-graduação, recebeu mestrado em 1938 e, no ano seguinte, ganhou uma das duas bolsas estudantis anuais para estudar química com Robert Robinson, agraciado com o Prêmio Nobel da área em 1947, na inglesa Oxford University. O outro vencedor da bolsa foi a também química Rita Harradence, com quem se casaria em 1941 (no mesmo ano em que recebeu seu doutorado de Oxford). Aliás, foi na University of Sydney, graças a um incidente engraçado, que ele conheceu sua futura esposa : Rita tinha quebrado um instrumento e, sabendo que Cornforth era capaz de soprar vidro, lhe pediu para repará-lo.

O, agora, novo casal trabalhou com Robinson em Oxford para determinar a molécula central da penicilina antibioticoterapica, durante a Segunda Guerra Mundial. Os Cornforths também começaram a investigar o problema da síntese química em esteróides (compostos integrais para estruturas celulares de plantas e animais). Sua esposa, igualmente brilhante em química orgânica, ajudava-o a se comunicar com os outros e colaborou estreitamente com ele em todos os momentos, já que Cornforth dependia completamente da leitura dos lábios e da comunicação escrita em 1945.

Em 1946, ainda ao lado de Robinson, começou a trabalhar para o National Institute of Medical Research (NIMR) em Hampstead e, em seguida, nos Mill Hill Research Laboratories em Londres. Durante este período, desenvolveu sua técnica para estudar os processos estereoquímicos das enzimas, pelo que conseguiu mostrar os caminhos dos processos bioquímicos. Vale ressaltar que o estudo da estereoquímica é tido como vital para a compreensão do mundo orgânico no seu nível bioquímico mais básico, mostrando como as coisas se encaixam no nível molecular e como elas afetam o gosto e o cheiro.

Em 1949, Cornforth ajudou Robinson a escrever “The Chemistry of Penicillin”, que detalhou o enorme esforço internacional que entrou no projeto de guerra. Ele e sua equipe da NIMR, simultaneamente com o químico Robert Wood, conseguiram completar a primeira síntese total da molécula de colesterol em 1951.

Na NIMR, Cornforth também começou o que se tornaria uma colaboração de 20 anos com George Popják, um bioquímico húngaro também interessado na molécula de colesterol. Ele queria descobrir como as células realmente sintetizavam o colesterol, então usou isótopos marcados de hidrogênio para rastrear os passos químicos do processo a partir de seus originais em ácido acético, técnica engenhosa que lhe garantiu o Prêmio Nobel de 1975.

Enquanto isso, continuava seu trabalho sobre a síntese e descrição da estrutura de muitos produtos naturais, incluindo hormonas e olefinas de plantas, substâncias sintéticas usadas nos têxteis. Ele completou a biossíntese de muitos outros esteróides, e conseguiu rastrear mais de uma dúzia de passos estereoquímicos na biossíntese do esqualeno, um precursor do colesterol que é amplamente distribuído na natureza. Em 1959, Cornforth publicou suas descobertas no “Journal of the Chemical Society”.

Em 1962, Cornforth e Popják deixaram o NIMR e se tornaram diretores conjuntos do Milstead Laboratory of Chemical Enzymology, da Shell Research Limited, em Sittingbourne (condado de Kent). O primeiro projeto ao qual se dedicaram foi um esforço para entender a estereoquímica das reações enzimáticas usando a substituição isotópica para introduzir artificialmente a assimetria. Em 1967, Cornforth também começou a colaborar no grupo de metais assimétricos com Hermann Eggerer. Popják deixou o Milstead em 1968 para novas atividades na Califórnia, deixando o australiano como único diretor do referido laboratório. Mais tarde naquele mesmo ano, Cornforth publicou os resultados de seu último estudo no “Journal of the American Chemical Society”.

Em 1965, ele concordou em assumir a responsabilidade de um posto como professor associado em ciências moleculares na University of Warwick, na inglesa Coventry, onde permaneceu no cargo até 1971, quando aceitou uma função semelhante na University of Sussex, em Brighton. Durante este seu período como professor, descobriu o amor docente pelo assunto sobre o qual era tão apaixonado. Tanto que, em 1975, ele decidiu ensinar em tempo integral em Sussex como professor de pesquisa da Royal Society, deixando o Milstead. Também nesse ano, compartilhou o Prêmio Nobel de Química com o suíço Vladimir Prelog.

Inúmeros prêmios foram concedidos a Cornforth por suas contribuições para a química, incluindo a Medalha Corday-Morgan, da Chemical Society de Londres (1953); a Medalha CIBA, da Biochemical Society (1965); a Medalha Davy, da Royal Society (1968); o Prêmio Guenther, da American Chemical Society (1969); o Royal Society Award (1976); além de um título de cavaleiro em 1977. O cientista australiano ministrou aulas regulares na University of Sussex até 1982, quando recebeu o status de emérito. Também ganhou a prestigiosa Medalha Copley, da Royal Society, em 1982.

Em 2002, ele e sua esposa emprestaram o nome para uma nova fundação na University of Sydney, a Cornforth Foundation, que apóia o ensino no campo da química orgânica. Ele também é membro de muitas academias científicas na Austrália, Holanda, Estados Unidos, Alemanha e Inglaterra.

Em 2003, Cornforth e muitos outros vencedores do Prêmio Nobel assinaram uma petição amplamente divulgada, afirmando a verdade do aquecimento global e exigindo ações para remediar seus efeitos. No documento, pedem uma ação unida para combater o aquecimento global e o armamento, objetivos que serão componentes vitais da estabilidade à medida que avançamos em direção ao maior grau de justiça.

O cientista e sua esposa passam parte de seu tempo em Saxon Down, Cuilfail, Lewes, na Inglaterra. Tiveram 3 filhos (John, Brenda e Philippa), e vários netos. Me junto aos colegas de Cornforth ao o descreverem como tendo uma personalidade calorosa e extrovertida, além de se destacar em inúmeras atividades de lazer, como tênis e jardinagem, mas nomeadamente o xadrez. Se tornou um pouco mais político em seus últimos anos e, ocasionalmente, fala sobre questões ambientais e sociais usando seu status de nobelista para aumentar o peso de suas declarações. 

Um dia, falando para uma platéia de estudantes, declarou que, quando Rita e ele estavam aprendendo química não era muito difícil, pois não havia tanta coisa para se saber, mas que agora sentia muito por aqueles ouvintes, porque há realmente muito a saber. Isso também graças aos seus trabalhos.

Posté par Elise Dawson

 

 

Veja também :

A verdade dói.

Se espalhando pelo mundo.

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Thylacoleo e a evolução convergente.

 

 

Commentaires (8)

 

Mais tarde ele disse que concentrou sua atenção na química porque oferece uma carreira na qual a surdez pode não ser uma desvantagem insuperável, e acabou se tornando um leitor habilidoso de lábios. Um professor, de nome Leonard Basser, o influenciou na direção desta área.

Sua esposa, Rita Harradence, era sua colega de classe universitária, uma colega química, um assessor valioso em comunicação com o mundo auditivo e seu freqüente colaborador científico.

Posté par Max Graham, 12 septembre 2005 à 19:36 | Répondre

 

A Austrália é um país jovem se comparado às nações do chamado Primeiro Mundo, no entanto conta com uma das economias mais saudáveis do globo, além de servir de exemplo em áreas como saúde, segurança, e direitos humanos.

Seu sistema educacional é de altíssimo nível, e é garantido por organismos fiscalizadores sérios e eficientes. Não é por menos que tantos jovens de todas as partes do planeta buscam esta nação para estudar, nos mais diversos níveis educacionais.

As escolas australianas facilitam a vida do estudante estrangeiro, permitindo que trabalhe vinte horas semanais ou, durante as férias, em período integral. Há centenas de colégios de língua inglesa e institutos de formação profissional, além de muitas universidades (públicas e privadas).

Tudo isso só poderia culminar em sucesso, como nas premiações do Nobel.

Posté par Arthur Léveillée, 12 septembre 2005 à 19:54 | Répondre

 

Enquanto brasileiro já supervaloriza uma suposta amizade ou o encontro que teve com aspirantes a subcelebridades, futebolistas, e atores ou cantores que usam a bunda para representar ou cantar (pra falar a verdade conheço um monte de débil mental que ao conseguir conversar - ou ao menos cumprimentar - com o pegador do bairro onde mora ou da empresa onde trabalha já sente que sua vida inteira valeu a pena ou fez sentido; talvez o suicídio seja uma boa opção para estes zeros, pelo bem deles e da sociedade), gente do seu nível se orgulha de conhecer e conviver com humanos do mais alto padrão moral e intelectual, de trajetória impecável e relevância social ímpar, como o Dr. Rodrigo Guizzardi, e até mesmo de nobelistas, como o Dr. John Cornforth.

Não é difícil separar o certo do errado, nem o proveitoso do inútil. Trabalhoso é ser alguém racional, ético e com discernimento, que consiga efetivamente enxergar o justo e, principalmente, optar e praticar o que é o correto, de verdade ! Quem é bom, é bom ! E quem é ruim, NÃO PRESTA !

Minha cara Elise, eu não vou cumprimentá-la pela maravilhosa carreira ou pelo trajeto de vida fantástico que você tem. Vou aplaudi-la pelo que você é !!! Parabéns por ser assim, ter os valores e os conceitos que tem, e por conseguir identificar o que é bom, tudo sempre de uma forma natural ! O resto é conseqüência !

Posté par Denise Duckett, 12 septembre 2005 à 20:08 | Répondre

Obrigada Denise! Você é maravilhosa!

Posté par Elise Dawson, 12 septembre 2005 à 22:10 | Répondre

Denise, você já deve ter percebido que aquilo que o cidadão verdadeiramente inteligente, honesto e maduro dispensa ou repudia, o mau elemento, de cabeça vazia, sem caráter e corrupto, agarra com unhas e dentes. Por que será que funciona assim? Uma mera coincidência?

Concordo = quem é bom, é bom. E quem é ruim, não presta, e tem de ser excluído socialmente!!! Acontece que o Brasil é o país mítico do faz de conta, do 1º de abril, e do dia do contrário! E o povo de lá, inserido neste contexto cultural endêmico, é feliz assim. Só não tem coragem de assumir. Nós é que temos de nos cuidar e zarpar deste inferno!!!

Posté par Andrea Scuderi, 13 septembre 2005 à 20:22 | Répondre

 

Cornforth era fascinado por fenômenos naturais e as leis que os regem e, como disse em uma entrevista em 2002, era uma pena as pessoas olharem para uma flor e não entenderem nada do que está acontecendo.

Ele, antes da universidade, estudou e praticou experimentos em um laboratório que foi construído na lavanderia da sua casa. Uma vez que grande parte da literatura sobre química estava escrita em alemão, aprendeu sozinho o idioma.

Acima de tudo, ele tem sido um forte defensor da cultura da dúvida como base para pesquisas. Em 1992, por ocasião do 75º aniversário de fundação do Instituto Químico Australiano, ele disse sobre os cientistas que têm de duvidar de tudo, pois são as únicas pessoas que prosperam sendo céticos. A ciência é a arte do possível, e o negócio dos cientistas não está no crer, mas no experimentar, verificar e desafiar as teorias, até mesmo suas próprias.

Posté par Lisa Alleway, 12 septembre 2005 à 21:38 | Répondre

 

A Austrália já conta com 8 prêmios Nobel, entre seus nascidos ou naturalizados:-
William Lawrence Bragg, Física, 1915
William Henry Bragg, Física, 1915
Sir Howard Florey, Fisiologia ou Medicina, 1945
Sir Frank Macfarlane Burnet, Fisiologia ou Medicina, 1960
John Carew Eccles, Fisiologia ou Medicina, 1963
Patrick White, Literatura, 1973
John Warcup Cornforth, Química, 1975
Peter Charles Doherty, Fisiologia ou Medicina, 1996
Já o lamentável Brasil não tem nenhum, e nem nunca terá ! Estou convicto de que nenhum indivíduo brasileiro teria uma formação tão boa, competente e dedicada, ou faria uma tão relevante contribuição para a humanidade, que lhe proporcionasse vencer a premiação sueca. Sinceramente, se algum dia tivermos um tupiniquim levando esta medalha, provavelmente seria alguém que abandonou o Brasil para construir em outro país a carreira que lhe valeu este reconhecimento, e estou sendo otimista nisso!

Posté par Marcus Siddle, 13 septembre 2005 à 18:18 | Répondre

Em tempo, no dia 3 de outubro último foram anunciados dois australianos, Barry Marshall e John Robin Warren, para o Nobel de Medicina de 2005.
Quem pode, pode. Quem não pode, bate palma!

Posté par Marília Hammel, 10 octobre 2005 à 21:10 | Répondre

 

 

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